sábado, 24 de novembro de 2012

Chuva de outono

Bate a chuva na vidraça esquecida,
No calor do leito, abafo o pensamento,
Da desventura vivida.
No calor do quarto, sinto a saudade do abraço,
De uma noite mal dormida.
A chuva na vidraça, como lamento,

De um coração despedaçado
De tanto, mascarar o sofrimento.
Na manhã chuvosa de outono,
Afasto-me em silêncio da solidão,
Digo adeus ao abandono.
Reforço em mim a ilusão,

Que a tempestade vai passar,

Trazendo de volta a esperança,
Porque o vento ao chegar, sussurra,
Lembrando por quem anseio,
Não permitindo descansar,
Na manhã de outono,
Onde a chuva, na vidraça,
Não acalma a dor que vai triste,
Dentro do coração de quem resiste...

sábado, 17 de novembro de 2012

Amizade, é...


Um dos meus livros favoritos quando era criança, intitulava-se “As Três Laranjas de Oiro”, de Charles Deulin, da editora Verbo Infantil. Num tempo, onde a televisão pública em Portugal, iniciava a programação a partir das 18H, onde a palavra internet, não fazia parte dos vocábulos da língua portuguesa, os livros, eram a companhia de muitas crianças e jovens. Li, vezes sem conta, a história, de um príncipe de um reino longínquo que partiu à aventura, em busca da sua amada. Seguindo um sonho que tivera numa noite, onde passeando num bosque com muitas laranjeiras, chegou junto de uma árvore e colheu uma laranja. Dentro da laranja saiu uma princesa que o encantou pela beleza. De tão deslumbrado que estava com o sonho, comunicou logo pela manhã ao seu pai, o rei, que partiria nesse mesmo dia, à procura daquela mulher, com quem queria casar. Antes que o pai, parasse de rir, com a história que acabava de ouvir, já o príncipe montado no seu cavalo branco, galopou a bom ritmo, para longe das terras do seu pai. São muitas as peripécias e os obstáculos que o príncipe encontra pelo caminho, na procura pela amada. Mas, no final, todo o esforço, toda a esperança é recompensada, os dois enamorados, vencem as dificuldades e ficam juntos e felizes para sempre. E, desde a união dos príncipes todo o reino, se encheu de abundância e de prosperidade. Desconheço, até que ponto, a história que acabo de resumir, me influenciou pela vida, na procura de um amor. Na certeza, que li muitas, outras histórias de amor que pelos ingredientes e detalhes, causaram um verdadeiro deleite, a alguém, como eu, que é apaixonada por romances, com finais felizes. Penso que todos nós, procuramos encontrar durante a nossa existência a outra nossa “metade”. Alguém com quem possamos compartilhar, os bons e, principalmente, os maus momentos. Acho que o ingrediente “secreto” de todas as ligações duradouras se deve ao ato de compromisso entre as pessoas. O amor entre as pessoas está consubstanciado no grau de confiança depositado e, que é, determinado, pela previsibilidade de conhecer o comportamento do outro. O amor, tal,  como a amizade, são relações afetivas, que têm como sentimentos preciosos, a lealdade, a compreensão, o carinho, a proteção. Os sentimentos de amizade ou amor não acontecem entre pessoas exatamente iguais, com os mesmos tipos de gostos ou vontades. Considero mesmo a amizade, como sendo um tipo de amor único. Ter sentimentos de amizade, mesmo, nas relações matrimoniais, é condição primordial, por acrescentar valor à relação, através da partilha de ideias, das informações sobre os momentos da vida. Quando se tem um amigo nunca se está sozinho!

domingo, 11 de novembro de 2012

Remexendo no baú das memórias de infância


“Ao meu querido marido com um grande abraço e muitos beijinhos que lhe ofereço este retrato da sua mulher muito amiga.

Tinita
Lisboa, 10-10-1934 “

Conheci a D. Silvina quando ela já era  idosa e estava doente. Morávamos no mesmo prédio, ela no 1º esquerdo, eu e a minha família no rés-do-chão. A D. Silvina vivia com a filha, com o genro e um neto que não era filho do casal. A filha dedicava-lhe a atenção que uma mãe é merecedora. Enquanto criança, vivi num tempo em Portugal, em que os vizinhos, mesmo em prédios, conviviam uns com os outros. Em algumas cidades podíamos encontrar bairros que mantinham as características de aldeias. Algumas cidades, eram, isso, mesmo, grandes aldeias. Portanto, não era coisa de estranhar, que enquanto criança, entrasse na casa dos meus vizinhos e convivesse em pleno direito, como pertencesse à família. Recordo, que na minha casa fazia finca-pé, nas horas das refeições. Mais tarde tomei consciência das estratégias da minha jovem mãe para me alimentar. Uma dessas estratégias passava por colocar a comida por ela confecionada na casa de uma das vizinhas e, onde aí, eu comia tudo, ao ponto de lhe dizer, que a comida das vizinhas, era mais saborosa do que a “dela”. A D. Silvina tal, como a filha, eram senhoras distintas e de fino trato. Recordo que a casa onde elas habitavam tinha uma decoração muito cuidada a roçar mesmo a sumptuosidade. Quando me encontrava na casa da minha vizinha do 1º andar esquerdo parecia que me encontrava dentro de um palácio. A minha mãe, em determinada altura, aceitou ajudar a filha a cuidar da D. Silvina, dando-me, assim, a oportunidade de realizar muitas brincadeiras naquelas divisões. Conhecia de cor e salteado a casa da minha vizinha do 1º andar esquerdo e, como já referi, deliciava-me a contemplar a arrojada decoração. A minha casa no rés-do-chão, de tipologia idêntica, tinha decoração, mais modesta. Gostava neste momento de me lembrar de todas as conversas de adultos que escutei. Mas a memória por vezes só alcança os acontecimentos de modo fragmentado. Com a fotografia da D. Silvina junto a mim, faço um esforço para me recordar do máximo que conseguir. Lembro-me que a D. Silvina ficou viúva muito cedo. Nunca conheci o marido e de quem ela teve três filhos, dois rapazes e uma rapariga. Todos os filhos  da D. Silvina casaram. Dos filhos masculinos teve ao todo cinco netos. Um desses filhos, o António, penso que era o mais velho, casou com uma irmã, do marido da filha, dessa união nasceram duas raparigas e um rapaz. O filho varão desse casal, foi dado a criar muito pequeno à filha da D. Silvina. Daí eu conhecer muito bem o Gil. Ele era pelo menos cinco anos mais velho do que eu por isso não éramos companheiros das brincadeiras embora nos dessemos bem. Lembro-me que a minha primeira bicicleta pertenceu-lhe. Um dia o meu pai, sabendo que os vizinhos de cima iam desfazer-se da bicicleta comprou-a para mim. Era uma bicicleta de rapaz na qual eu tinha de me esforçar para chegar aos pedais. O Gil, tal como a sua avó paterna, também, já partiu… Nos anos noventa emigrou para Venezuela e por lá constituiu família. Um acidente rodoviário tirou-lhe a vida em idade muito precoce. Hoje remexi no baú das memórias e aproveito para prestar à D. Silvina a minha sincera homenagem publicando a foto que ela dedicou ao seu marido em 10 de outubro de 1934. A D. Silvina, tal, como a filha Mariazinha, fazem parte das memórias felizes da minha existência, as quais gosto muito de visitar. Quando eu, tinha 8 anos, a D. Silvina, partiu! Foi no dia 8 de Janeiro de 1978 com idade avançada e doente … Paz à sua alma.

domingo, 4 de novembro de 2012

Tudo Tratado...


Quando partiste um vazio ficou em mim, foi uma dor difícil de suportar. Por mais lágrimas que os meus olhos chorassem, não foram suficientes para apagar a chama que me consumia. Não cheguei a tempo de me despedir de ti. A mãe chamou-nos, para que eu e a minha irmã te víssemos,  ainda, com vida. Fomos o mais rápido que conseguimos e, embora a distância fosse curta, não chegámos a tempo de dizer o último adeus. Partiste muito sereno, na noite, do dia 27 de Junho. Partiste quando desejaste. Como, sempre, aconteceu, durante vinte e sete anos, a mãe estava junto de ti, a proteger-te, a cuidar de ti, em extrema dedicação. Não encontro palavras que possam definir, tamanho amor. Amor que há muito tinha evoluído para níveis mais elevados do que aqueles que ligam duas pessoas pelo casamento. A mãe, seguindo o ritual de cuidadora exemplar, já tinha aprumado o teu corpo, para realizares a viagem. A mãe é a pessoa mais bondosa que conheço. A mãe é aquilo que chamamos de força da natureza. Mulher de uma coragem ímpar, enfrentou sempre com desembaraço, todas as adversidades da vida! Quando chegamos ao teu leito, já tinha o teu  espírito  partido. Possivelmente, do lugar onde te encontras, como, espectador  visualizaste toda a situação. A mãe, referiu, que recusaste o jantar, olhaste para ela, em jeito de despedida e  fechando os olhos, partiste. Sabes, pai, considero que uma percentagem de nós, humanos, desejamos, partir, assim, serenamente. No entanto, só aqueles, que deixam os assuntos terrestres tratados, assim, o fazem… Há muitas coisas para as quais te quero agradecer, mas, há uma coisa em particular. Durante, muitos anos, travamos uma luta acérrima com o homem que nos arrendou a casa de família. Uma pessoa, que descurou todos os deveres de um proprietário e, durante, quase trinta anos, só se limitou a receber, mensalmente, o dinheiro das rendas. Foi necessário recorrer ao Tribunal para expor a situação de incúria deste proprietário. Tal, como muitas, vezes sucede, no nosso processo, não houve justiça. O proprietário alegou não ter posses financeiras, para financiar as obras de restauro do edifício mas, tão pouco procurou a ajuda de programas estatais de reabilitação urbana.  Como sabes, há justiça para pobres e justiça para ricos. Os ricos podem pagar a advogados para defenderem os seus direitos, os pobres, têm que se contentar com a sorte, de lhes nomearem um advogado. Nestas coisas da sorte, há bons e maus advogados. Há advogados que elevam a altos patamares a sua nobre profissão, defendendo com unhas e dentes as ações, mesmo, sendo, nomeados pela segurança social. No meio do infortúnio tivemos sorte! Quatro dias antes de partires, a advogada oficiosa que te patrocinava, apresentou, a tua defesa. Li a peça processual que ela entregou em Tribunal em 23 de Junho, estava brilhante! Colocou em evidência todos os ângulos do litígio e pediu justiça. Quatro dias depois partiste… foi coincidência? Não acredito em coincidências, mas, acredito, em assuntos tratados. A casa de família, era o teu último assunto a tratar… O que pretendo agradecer pai, foram todas as conversas, que mantiveste com Deus. Quero agradecer-te por todos os diálogos em silêncio para que Deus protegesse a tua família e, em particular  a mãe! Dado o teu estado de saúde, que te incapacitou, durante vinte e sete anos, sem te puderes levantar da cama ou mesmo verbalizar palavras, estiveste, sempre, atento às questões que te rodeavam. Aproxima-se, agora, o desfecho da ação em Tribunal. No dia 12 de Novembro, há a possibilidade de se colocar um ponto final ao litígio entre a mãe e o arrendatário. Estou confiante no desfecho da ação  porque a mãe tem uma advogada oficiosa,  que é  briosa no desempenho das suas funções. É brilhante na exposição dos aspetos jurídicos  muito humana  e  não se  intimida com o advogado do senhorio  mais velho e por isso mais experiente. De onde estás, sei que estarás a torcer, por um desfecho feliz! Desejo, muito, também, que esta situação termine a contendo da mãe e, principalmente, que se faça justiça…
Até um dia pai,
A tua filha