sábado, 7 de março de 2015

Voltar ao sonho outra vez...

Não era um dia como os outros. Desde algum tempo que um vazio interior ocupava demasiado espaço num local que devia estar preenchido com sensações diferentes daquelas que sentia. Tentou em alguns dias contrariar o estado anímico mas foram tentativas realizadas em vão. Agora parecia que o estado de marasmo tinha passado e sentiu algo diferente a apoderar-se do seu estado físico e psicológico. Pareceu-lhe que os assuntos que durante tanto tempo ocuparam a alma, afinal eram de fácil resolução. Todos os problemas parecem sempre fáceis quando se encontram as hipóteses de resposta, pensou. Ao longo da vida existem vários estados psicológicos concomitantes no mesmo momento. Por vezes dá a sensação que possuímos várias personalidades dentro de nós e todas elas desenvolvem uma comunicação silenciosa umas com as outras. Dava agora graças por sair daquele estado que designou de letargia, onde as funções da vida foram atenuadas por forma tal, que parecem estar suspensas. No entanto, durante a caminhada interior que lhe pareceu interminável, arrumou muitas das suas ideias. Por característica sempre gostou de se aconselhar consigo própria. Por vezes submetia as ideias aos outros mais próximos, apenas àqueles em que confiava, na tentativa de comprovar ou reprovar os seus próprios pensamentos. Normalmente, gosta e confia nas pessoas que a rodeiam. Embora não o faça de uma maneira precipitada. Os seus ideais, ou melhor a forma como encara a vida, foi-lhe permitindo com o avançar da idade extrair das pessoas as características mais positivas que cada ser humano possui. Gosta de colocar em evidência os sentimentos positivos em detrimento de outros que considera negativos. Como pessoa astuta facilmente, capta os sinais que as pessoas emitem sem darem por isso. Está sempre atenta ao entoar das palavras e, principalmente, aos movimentos corporais. Não são poucas as vezes que o corpo contradiz as belas frases que saem pela boca. Esse jogo entre as palavras e os gestos fascina-a. Mas até quando verifica que as palavras são vazias de conteúdo e não passavam de tentativa de ludibriar o destinatário, tenta perceber se há hipótese de atribuir uma segunda oportunidade ao interlocutor. Considera-se uma pessoa generosa. Desde há muito aprendeu que todos os seres humanos possuem luz interior para iluminar os caminhos sombrios mas nem todos conseguem colocar em auxílio próprio, essa faculdade. O  extraordinário aconteceu numa manhã de inverno, onde os raios de sol, teimavam em perturbar as condições atmosféricas caracterizadas pelo frio. Há muito tempo que não sonhava. Gostava muito de sonhar porque a imaginação podia soltar-se, onde as impossibilidades podiam acontecer. Afinal, um simples sonho, permitiu que sensações há muito recalcadas, ligadas a certos impulsos, pudessem tocar não apenas as lembranças. É tão verdade que o sonho comanda a vida! Gostou de imaginar que os deuses no Olimpo quisessem com o sonho dar-lhe também uma oportunidade. Talvez presenteá-la pelo conjunto de ações ao longo da vida. O sonho pareceu-lhe tão real que pensou tratar-se por uma fração de segundos de uma realidade vivida. Naquele tempo que não tinha dias, nem horas, o amor vive em toda a plenitude. Não consegue por mais que se esforce, descrever a sensação que lhe invadiu o corpo e a alma  causando-lhe bem-estar. Talvez as lágrimas, com um misto de saudade, possam traduzir as emoções do momento. Podia lá ter ficado naquele tempo e, naquele lugar. No entanto, despertou. Os raios de sol, entraram pelas frinchas da persiana da janela, transportando-a à realidade, onde vive. Mas o tempo presente não muda o significado daquele instante. Ao despertar soube intimamente que podia voltar ao sonho sempre que quisesse. Naquele tempo e, naquele espaço, o amor vive para todo o sempre!

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Diário de um caminhada


No domingo, dia 1 de Novembro de 2009 juntei mais uma data à coleção, foi inserida na pasta das datas más, onde já constava o dia 27 de Setembro de 2005. Foi de facto esta a tal data, a que deu inicio ao declínio. Entretanto já passaram quatro anos que lamentam o silêncio daquela noite, a ausência de comunicação no dia seguinte e, depois quando houve palavras foram fracas na resposta que se aguardava. Não se esquece a mágoa que deu origem a uma outra forma de encarar a vida. Nestas frases valem as reticências e todas elas serão poucas para expressar o sentimento da perda. Basta sentir porque o ser humano é feito de emoções. Tal como um pintor, que expressa pela arte e pelas cores as emoções, também os humanos pintam a vida. Às vezes pintamos a vida com tonalidades de cor demasiado cinzentas a que juntamos a cor da lágrima. Hoje decidi ler textos. Gosto de ler textos que falem principalmente de amor. Este texto que escolhi para ler, está bem escrito prende-me a atenção porque alerta os indivíduos para aquilo que se perde na individualidade de cada um, no egoísmo quando não sabemos envolver os outros em nós. 
 
Dia 5 de Novembro de 2009
Ontem uma amiga ligou-me por volta das 14:40, disse-me que  o pai devido a doença súbita partiu. Lamento. Rezo. Desejo que Deus Lhe perdoe todos os pecados e o receba no seu reino.

Estas despedidas sentidas partem-me o coração. Depois da notícia fiquei com uma forte dor de cabeça e tenho as lides domésticas ainda para fazer. Tomarei um qualquer fármaco que me alivie o desconforto da dor e mais tarde receberei em casa os filhos dela. Oxalá estas crianças sejam fortes para superarem a partida do avô que tanta falta lhes faz. Efetivamente não está a ser um ano fácil para esta família. Em Agosto a minha amiga colocou um ponto final num casamento que durava há décadas. E agora o pai…
 
Dia 13 de Novembro de 2009
Hoje é sexta-feira, dia 13… algumas pessoas têm a ideia que o 13 é o nº do azar e, quando este dia, coincide com a sexta-feira, estamos perante um dia em que mais vale ficar em casa. Para mim só estas últimas palavras traduzem bem a “insignificância” da sexta-feira 13 – interrogo-me e, quem não tem casa, onde fica? Esses sim, é que estão cheios de azar por não possuírem teto onde dormir - penso.
 
Todos os dias desde que acordo, faço sempre os possíveis para acreditar que o dia de hoje será sempre melhor do que o anterior. Reafirmo a presença de Deus através do Espírito Santo. Sou uma pessoa de Fé. Considero que há uma luta constante entre o bem e o mal. A Palavra, o Verbo segue o caminho. O homem ainda tem muito para aprender na escolha entre o bem e o mal. A caminhada continua...

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Uma questão de tempo

Sentada numa cadeira colocou as mãos entrelaçadas sobre a cabeça como quisesse com este gesto proteger-se dos seus próprios pensamentos. Logo ela que tinha por lema: viver a vida intensamente, como se o amanhã não existisse. Observei-a com a distância que o olhar permite, não quis em nenhum momento perturbar-lhe o silêncio. Pela forma como se contorcia na cadeira percebi que ela não estava nos seus melhores dias. Conheço-a bem demais para que haja a necessidade de palavras para exprimirem o seu estado psicológico. Entre amigas verdadeiras, até os silêncios transmitem mensagens, para outros indecifráveis. Intimamente até sabia aquilo que a perturbava. Talvez por isso considerei, ser mais um motivo para a deixar percorrer aquele caminho interior que só o próprio deve trilhar. Ela sabe intimamente se precisar de alguém ter-me-á a seu lado. Talvez mais tarde ela me chame para revisitarmos algumas lembranças. Talvez mais tarde eu lhe recorde a força que ela possui e que tudo aquilo que agora lhe é desconfortável, dentro de um tempo pertencerá ao passado. Neste instante até este meu monólogo interior parece reforçar o sentimento de amizade que nos une. Contudo ela de tão enredada nos pensamentos, tão pouco deu por mim. Observo-a. Tem o semblante demasiado carregado, fico triste de a ver assim. Numa ocasião confidenciou-me que já não acreditava na felicidade, disse-me que a viveu tão intensamente num tempo, que esgotou essa sensação de bem-estar. Retorqui e disse-lhe que a felicidade é um estado de satisfação onde pequenas coisas podem fazer a diferença. Contei-lhe que por vezes, ainda dou por mim a sorrir sem motivo aparente e essa sensação é boa de sentir. Ao ouvir as minhas palavras que tentavam contrariar um estado de espírito distante, fitou-me nos olhos e,  disse-me, que todos os sentimentos só atingem os objectivos, se forem verdadeiros. O tempo, por exemplo, esse eterno amigo, que suaviza as mágoas, nem sempre está do nosso lado, diga-se no tempo certo. Parece que tudo acontece realmente quando tem de acontecer e, nem sempre as historias têm o final que se deseja. Continuou,  a falar pausadamente, como se medisse todas palavras: por vezes sentimos uma sensação de vazio interior  que parece ser preenchido por emoções confusas, tipo uma manta de retalhos. Faz-se o que se pode e nem sempre o que se deve para seguir em frente. Com o tempo aprende-se a contornar os obstáculos embora alguns persistam em atrapalhar a caminhada. Muitas interrogações ficarão sem resposta. O passado é muitas vezes eleito o melhor dos tempos, sem que possuamos a noção que o presente é realmente tudo o que verdadeiramente importa. Palavras sábias, pensei...

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Porque o céu tem a cor dos teus olhos


Podia ter ido a uma Igreja porque gosto da tranquilidade dos Templos, mas não fui. Segui o mesmo ritual de muitos dias dirigindo-me ao banco de jardim de onde avisto o céu e o mar. Da minha varanda improvisada sobre o Tejo observo o azul do céu a confundir-se com o do mar. A cor azul que tanto me recorda os olhos da Lina. Há uns tempos atrás as notícias sobre a Lina, não foram aquelas que gostaria de ter escutado. A Lina ontem, 4 de junho, despediu-se de nós. O sofrimento que o cancro lhe causava já lhe feria a alma. Lamentei a sua partida com o coração muito apertado. Hoje sinto-me triste. Não fossem as lágrimas que ajudam a atenuar a dor sentir-me-ia muito pior. Em memória da Lina recuo até à minha infância. A minha querida Lina, uma mulher pequena, de cabelo louro que irei sempre recordar com muito carinho. Naqueles tempos felizes a família Santos Borges era como me pertencesse. Gostava tanto da boa disposição daquela gente durante os convívios. Recordo que a Lina era exímia na confeção do puré de batata com almôndegas. Acho que durante muito tempo este foi o meu prato favorito. Não sei se a Lina morreu feliz…uma daquelas paixões, que presumo arrebatadora a um dos membros da família Santos Borges fez com que deixasse para trás uma outra vida familiar onde se incluíam dois filhos. Enquanto fui criança jamais tive perceção dessa sua escolha. Estou certa que o fez dando voz a um grande amor… também, asseguro, que aquela peça do seu puzzle jamais foi substituída por outra. Sentia-se a nostalgia na voz quando falava dos filhos. Talvez falasse para acalmar a dor que trazia no coração. Talvez tenha comentado o assunto comigo porque das crianças eu era a mais velha – lamento, não  ter dado a importância devida às suas palavras mas aos dez ou onze anos o entendimento das coisas sobre adultos era proporcional à minha existência.  A minha irmã mais nova também recebia muitas atenções da Lina e do seu companheiro. Devido ao seu comportamento tranquilo a minha irmã mais nova acompanhava-a muitas vezes no seu local de trabalho. A Lina confeciona casacos de malha e por ser muito profissional no seu oficio não lhe faltavam as encomendas. Fruto do amor da sua vida a Lina teve outra filha, hoje uma mulher. Estas singelas palavras destinam-se a homenagear uma a minha querida amiga pelos bons momentos que partilhamos em conjunto. Tudo o que agora desejo é que esta guerreira descanse eternamente em paz.

domingo, 25 de maio de 2014

Interrogações


Como foi possível outros escrevessem sobre nós? Li as frases uma a uma e depois cada parágrafo. Eu que pensava que aquele momento só a nós pertencia... Mas agora até o mais ínfimo pormenor foi revelado. Quem de nós dois foi incauto e permitiu que outros captassem a nossa magia? Estaríamos os dois tão distraídos que perdemos a noção que uma multidão nos observava? Neste preciso momento recordo que as palavras até foram parcas e nem sei mesmo se elas chegaram a existir. Como foi então possível que alguém escrevesse sobre nós? Que individualidade essa tão sensível que captou a intensidade daquele momento? Como terá conseguido tamanha proeza? Foi através do brilho dos nossos olhos que soube as palavras que guardavamos no coração? Durante séculos só de fugida e, apenas em momentos furtuitos voltei em pensamento ao mesmo lugar na tentativa de vivenciar as emoções sentidas. Contínuo inquieta e com demasiadas interrogações a pairarem na alma. Será que foi o calor que emanou dos corpos que permitiu que outros soubessem de nós? Sempre que a dor da saudade bate mais forte, volto sozinha ao lugar de onde não devia ter saído para contigo ficar. Mesmo quando partiste para um lugar que desejo melhor continuei-te a sentir, como se a tua viagem nunca tivesse ocorrido. Não podendo ter partido contigo porque a vida continuou queria que aquele instante de magia só a nós dois pertencesse. Por isso revi nas páginas de um livro que não fui eu nem tu que o escreveu a imagem daquele instante que de tão nosso se perpetuou pelos tempos. Tivesse eu escrito aquele capitulo as palavras não seriam outras mas iguais. O autor de tão belas frases teve a arte e o engenho de se antecipar e descrever o amor na sua essência universal. Embora eu quisesse ser egoísta para que no mundo ninguém soubesse de nós, descobri que as emoções se transcendem e, não se deixam aprisionar por ninguém. Também, talvez, por isso, os amores verdadeiros sejam eternos e, vivem para além do tempo...