Não era um dia como os outros. Desde algum
tempo que um vazio interior ocupava demasiado espaço num local que devia estar
preenchido com sensações diferentes daquelas que sentia. Tentou em alguns dias
contrariar o estado anímico mas foram tentativas realizadas em vão. Agora
parecia que o estado de marasmo tinha passado e sentiu algo diferente a
apoderar-se do seu estado físico e psicológico. Pareceu-lhe que os assuntos que
durante tanto tempo ocuparam a alma, afinal eram de fácil resolução. Todos os
problemas parecem sempre fáceis quando se encontram as hipóteses de resposta,
pensou. Ao longo da vida existem vários estados psicológicos concomitantes no
mesmo momento. Por vezes dá a sensação que possuímos várias personalidades
dentro de nós e todas elas desenvolvem uma comunicação silenciosa umas com as
outras. Dava agora graças por sair daquele estado que designou de letargia, onde
as funções da vida foram atenuadas por forma tal, que parecem estar suspensas.
No entanto, durante a caminhada interior que lhe pareceu interminável, arrumou
muitas das suas ideias. Por característica sempre gostou de se aconselhar
consigo própria. Por vezes submetia as ideias aos outros mais próximos, apenas
àqueles em que confiava, na tentativa de comprovar ou reprovar os seus próprios
pensamentos. Normalmente, gosta e confia nas pessoas que a rodeiam. Embora não
o faça de uma maneira precipitada. Os seus ideais, ou melhor a forma como
encara a vida, foi-lhe permitindo com o avançar da idade extrair das pessoas
as características mais positivas que cada ser humano possui. Gosta de colocar
em evidência os sentimentos positivos em detrimento de outros que considera
negativos. Como pessoa astuta facilmente, capta os sinais que as pessoas emitem
sem darem por isso. Está sempre atenta ao entoar das palavras e, principalmente,
aos movimentos corporais. Não são poucas as vezes que o corpo contradiz as
belas frases que saem pela boca. Esse jogo entre as palavras e os gestos
fascina-a. Mas até quando verifica que as palavras são
vazias de conteúdo e não passavam de tentativa de ludibriar o destinatário, tenta
perceber se há hipótese de atribuir uma segunda oportunidade ao interlocutor.
Considera-se uma pessoa generosa. Desde há muito aprendeu que todos os seres
humanos possuem luz interior para iluminar os caminhos sombrios mas nem todos
conseguem colocar em auxílio próprio, essa faculdade. O extraordinário
aconteceu numa manhã de inverno, onde os raios de sol, teimavam em perturbar as
condições atmosféricas caracterizadas pelo frio. Há muito tempo que não sonhava.
Gostava muito de sonhar porque a imaginação podia soltar-se, onde as
impossibilidades podiam acontecer. Afinal, um simples sonho, permitiu que
sensações há muito recalcadas, ligadas a certos impulsos, pudessem tocar não
apenas as lembranças. É tão verdade que o sonho comanda a vida! Gostou de imaginar
que os deuses no Olimpo quisessem com o sonho dar-lhe também uma oportunidade.
Talvez presenteá-la pelo conjunto de ações ao longo da vida. O sonho
pareceu-lhe tão real que pensou tratar-se por uma fração de segundos de uma
realidade vivida. Naquele tempo que não tinha dias, nem horas, o amor vive em
toda a plenitude. Não consegue por mais que se esforce, descrever a sensação que lhe invadiu o corpo e a alma causando-lhe bem-estar. Talvez as lágrimas, com um misto de
saudade, possam traduzir as emoções do momento. Podia lá ter ficado naquele
tempo e, naquele lugar. No entanto, despertou. Os raios de sol, entraram pelas
frinchas da persiana da janela, transportando-a à realidade, onde vive. Mas o
tempo presente não muda o significado daquele instante. Ao despertar soube intimamente
que podia voltar ao sonho sempre que quisesse. Naquele tempo e, naquele espaço,
o amor vive para todo o sempre!
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