Podia
ter ido a uma Igreja porque gosto da tranquilidade dos Templos, mas não fui.
Segui o mesmo ritual de muitos dias dirigindo-me ao banco de jardim de onde
avisto o céu e o mar. Da minha varanda improvisada sobre o Tejo observo o azul
do céu a confundir-se com o do mar. A cor azul que tanto me recorda os
olhos da Lina. Há uns tempos atrás as notícias sobre a Lina, não foram aquelas que
gostaria de ter escutado. A Lina ontem, 4 de junho, despediu-se de nós. O
sofrimento que o cancro lhe causava já lhe feria a alma. Lamentei a sua partida
com o coração muito apertado. Hoje sinto-me triste. Não fossem as lágrimas que
ajudam a atenuar a dor sentir-me-ia muito pior. Em memória da Lina recuo até à
minha infância. A minha querida Lina, uma mulher pequena, de cabelo louro que
irei sempre recordar com muito carinho. Naqueles tempos felizes a família
Santos Borges era como me pertencesse. Gostava tanto da boa disposição daquela
gente durante os convívios. Recordo que a Lina era exímia na confeção do puré
de batata com almôndegas. Acho que durante muito tempo este foi o meu prato
favorito. Não sei se a Lina morreu feliz…uma daquelas paixões, que presumo
arrebatadora a um dos membros da família Santos Borges fez com que deixasse
para trás uma outra vida familiar onde se incluíam dois filhos. Enquanto fui
criança jamais tive perceção dessa sua escolha. Estou certa que o fez dando voz
a um grande amor… também, asseguro, que aquela peça do seu puzzle jamais foi
substituída por outra. Sentia-se a nostalgia na voz quando falava dos filhos.
Talvez falasse para acalmar a dor que trazia no coração. Talvez tenha comentado
o assunto comigo porque das crianças eu era a mais velha – lamento, não ter dado a importância devida às suas palavras mas aos dez ou
onze anos o entendimento das coisas sobre adultos era proporcional à minha
existência. A minha irmã mais nova
também recebia muitas atenções da Lina e do seu companheiro. Devido ao seu
comportamento tranquilo a minha irmã mais nova acompanhava-a muitas vezes no
seu local de trabalho. A Lina confeciona casacos de malha e por ser muito
profissional no seu oficio não lhe faltavam as encomendas. Fruto do amor da sua
vida a Lina teve outra filha, hoje uma mulher. Estas singelas palavras
destinam-se a homenagear uma a minha querida amiga pelos bons momentos que
partilhamos em conjunto. Tudo o que agora desejo é que esta guerreira descanse
eternamente em paz.