domingo, 11 de novembro de 2012

Remexendo no baú das memórias de infância


“Ao meu querido marido com um grande abraço e muitos beijinhos que lhe ofereço este retrato da sua mulher muito amiga.

Tinita
Lisboa, 10-10-1934 “

Conheci a D. Silvina quando ela já era  idosa e estava doente. Morávamos no mesmo prédio, ela no 1º esquerdo, eu e a minha família no rés-do-chão. A D. Silvina vivia com a filha, com o genro e um neto que não era filho do casal. A filha dedicava-lhe a atenção que uma mãe é merecedora. Enquanto criança, vivi num tempo em Portugal, em que os vizinhos, mesmo em prédios, conviviam uns com os outros. Em algumas cidades podíamos encontrar bairros que mantinham as características de aldeias. Algumas cidades, eram, isso, mesmo, grandes aldeias. Portanto, não era coisa de estranhar, que enquanto criança, entrasse na casa dos meus vizinhos e convivesse em pleno direito, como pertencesse à família. Recordo, que na minha casa fazia finca-pé, nas horas das refeições. Mais tarde tomei consciência das estratégias da minha jovem mãe para me alimentar. Uma dessas estratégias passava por colocar a comida por ela confecionada na casa de uma das vizinhas e, onde aí, eu comia tudo, ao ponto de lhe dizer, que a comida das vizinhas, era mais saborosa do que a “dela”. A D. Silvina tal, como a filha, eram senhoras distintas e de fino trato. Recordo que a casa onde elas habitavam tinha uma decoração muito cuidada a roçar mesmo a sumptuosidade. Quando me encontrava na casa da minha vizinha do 1º andar esquerdo parecia que me encontrava dentro de um palácio. A minha mãe, em determinada altura, aceitou ajudar a filha a cuidar da D. Silvina, dando-me, assim, a oportunidade de realizar muitas brincadeiras naquelas divisões. Conhecia de cor e salteado a casa da minha vizinha do 1º andar esquerdo e, como já referi, deliciava-me a contemplar a arrojada decoração. A minha casa no rés-do-chão, de tipologia idêntica, tinha decoração, mais modesta. Gostava neste momento de me lembrar de todas as conversas de adultos que escutei. Mas a memória por vezes só alcança os acontecimentos de modo fragmentado. Com a fotografia da D. Silvina junto a mim, faço um esforço para me recordar do máximo que conseguir. Lembro-me que a D. Silvina ficou viúva muito cedo. Nunca conheci o marido e de quem ela teve três filhos, dois rapazes e uma rapariga. Todos os filhos  da D. Silvina casaram. Dos filhos masculinos teve ao todo cinco netos. Um desses filhos, o António, penso que era o mais velho, casou com uma irmã, do marido da filha, dessa união nasceram duas raparigas e um rapaz. O filho varão desse casal, foi dado a criar muito pequeno à filha da D. Silvina. Daí eu conhecer muito bem o Gil. Ele era pelo menos cinco anos mais velho do que eu por isso não éramos companheiros das brincadeiras embora nos dessemos bem. Lembro-me que a minha primeira bicicleta pertenceu-lhe. Um dia o meu pai, sabendo que os vizinhos de cima iam desfazer-se da bicicleta comprou-a para mim. Era uma bicicleta de rapaz na qual eu tinha de me esforçar para chegar aos pedais. O Gil, tal como a sua avó paterna, também, já partiu… Nos anos noventa emigrou para Venezuela e por lá constituiu família. Um acidente rodoviário tirou-lhe a vida em idade muito precoce. Hoje remexi no baú das memórias e aproveito para prestar à D. Silvina a minha sincera homenagem publicando a foto que ela dedicou ao seu marido em 10 de outubro de 1934. A D. Silvina, tal, como a filha Mariazinha, fazem parte das memórias felizes da minha existência, as quais gosto muito de visitar. Quando eu, tinha 8 anos, a D. Silvina, partiu! Foi no dia 8 de Janeiro de 1978 com idade avançada e doente … Paz à sua alma.

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