sábado, 18 de fevereiro de 2012

Voltar às origens

Tenho amiúde a necessidade  de voltar às  origens. Viajo, para uma pequena povoação  ao norte de Portugal, na Beira–Alta. Refugio-me na casa da minha avó paterna, onde moram as melhores recordações de infância. Na velha casa de granito, já não encontro a minha avó, que partiu de nós há muitos anos. Marco, então, encontro com memória da velhinha sentada no alpendre da casa, calçada com pantufinhas de lã que a protegiam do frio. As suas mãos  engelhadas ajeitavam o lindo chapéu de palha de fita azul enquanto, sorria para mim. Cá em baixo, na escadaria exterior da casa, eu ternamente, retribuía-lhe o sorriso, enquanto, enchia no fontanário público os recipientes com a água que havíamos de utilizar durante o dia. Foi deste magnífico local, no concelho de Armamar, que em 1953, partiu o meu pai aos onze anos, para trabalhar em Lisboa, como moço de recados, na praça da Ribeira. O meu pai ficou aos cuidados do meu avô, seu pai, que alguns anos antes, também, havia partido para a capital, com o ensejo de encontrar melhores condições de vida. Esses tempos, foram muito difíceis para a minha avó Ana, que devido à partida do meu avô ficou sozinha e responsável, pelos dois filhos ainda pequenos, dois sobrinhos, filhos de uma irmã mais velha que havia falecido e, tinha, ainda, a cargo a mãe e um irmão. O meu avô paterno, deslumbrado com Lisboa, com o tempo esqueceu-se dos deveres contraídos com a minha avó e enamorou-se por outra moça com quem havia de constituir família. O desgosto amoroso da minha avó Ana foi tão doloroso, que desde a separação do meu avô, nunca mais se apaixonou por ninguém. Enquanto, criança, nunca reflecti muito, sobre o assunto, pois o alcance que eu detinha sobre as inquietudes dos adultos, era limitada à escassa experiência de vida.
A pessoa que o meu avô desposou e, a quem carinhosamente, chamávamos de tia Micas, acolheu o meu pai em sua casa e, inclusivamente, obrigou, o meu avô Francisco, a perfilhar o filho no registo civil. Desses tempos em Portugal, existem, muitos filhos de pai incógnito, o meu pai não fez parte dessa estatística. Não foram tempos nada fáceis para a minha avó Ana... Reza a história familiar que o seu filho mais novo, o meu tio Diamantino, morreu ainda criança e pouco tempo depois, houve um incêndio que lhes destruiu a habitação, possivelmente, devido ao lume da braseira que lhes servia de aquecimento, estar mal acondicionado. Valeram-lhes, as gentes da terra, que mediante tanto infortúnio, prontamente, lhes providenciaram outro tecto. Estou convencida que a minha avó Ana durante a sua vida, jamais conseguiu ultrapassar o sentimento de abandono por parte do meu avô, e tão pouco, a morte prematura do seu filho mais novo. A minha avó Ana aos vinte e poucos anos, tornou-se uma mulher amarga, deixando de expressar publicamente, os seus sentimentos e as emoções. Em 1964, consigo imaginar o seu sofrimento ao ver o meu pai embarcar num navio que o ia transportar para a guerra do Ultramar, sem a mínima garantia que ele voltasse com vida a Portugal… Tenho que referir que a extrema dedicação ao meu pai, em nada facilitou, a sua a relação com a minha mãe. Foi uma sogra demasiado austera, sem que a minha mãe, merecesse tal tratamento… Como avó, foi tudo aquilo o que eu e a minha irmã poderíamos desejar. Passados tantos anos, pelos meus olhos, rolam todas as lágrimas de saudade, com a sua partida…

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