Ao defrontarem-se com uma
realidade tão diferente daquela que esperavam encontrar na chegada depois da
viagem de trezentos quilómetros poder-se-á afirmar com convicção que foram muitas as emoções que
se apoderaram da mente. A minha avó mais emotiva, talvez pelo espanto, nem teve
lágrimas para expressar a dor que sentiu. Num impulso pediu ao avô para
regressar de imediato a casa. Afinal era por ela que todos ali estavam para
passar uns dias de férias. Foi pela mão da avó que o avô conheceu a terra
algarvia ainda no tempo em que ambos ainda eram namorados. Depois de casados os
filhos, primeiro a minha mãe e, depois o tio continuaram a viajar para lá
sempre que os avós podiam. Aquela casa era uma espécie de fiel depositária de
tantas histórias, onde várias famílias e vivências se cruzaram. A pequena casa
estava situada numa zona privilegiada do Barlavento algarvio, perto da cidade e
de belíssimas praias e ao mesmo tempo de uma considerável extensão de terreno
plantado com árvores. Mediante tão horrendo cenário em silêncio a avó
perguntava-se o que fazer? Não conseguiu encontrar uma sugestão, um caminho que
lhe permitisse um pensamento que acalmasse a desolação interior. Foi o avô
Manel que resolveu o assunto. Tomou a si a decisão de ficarem todos na casa e
continuarem com o plano de férias inicialmente traçado. Segundo o avô todos
colocariam mãos à obra e na manhã seguinte resolveriam todos os assuntos
relacionados com a casa. Acho que esta tomada de decisão surpreendeu pela
positiva a minha avó mais habituada a ser ela a mais pragmática perante
as adversidades. Mas desta vez não lhe coube o comando do leme, foi o avô que
levou o barco em frente. Arregaçaram as mangas e decidiram as tarefas entre os
dois. Tive conhecimento que a mãe e o tio permaneceram dentro do automóvel por
largo tempo, entretidos numa qualquer brincadeira que inventaram no momento e
que também teve a função de os tranquilizar. Entretanto o avô e a avó quiseram
abrir a porta das traseiras da casa para acederem ao tal pátio que há pouco vos
falei e foi nesse momento que deram conta que para além do uso indevido da
habitação os malfeitores também se tinham apoderado da chave que abria essa
porta. Era costume a tia Isabel deixar as chaves da porta das traseiras da casa
num chaveiro na cozinha, perto do fogão, procedimento que facilitou a vida aos
penetras dentro da habitação. Que situação bizarra, para além de uma janela
arrombada e sem vidro, tinham agora uma porta nas traseiras da casa que podia
ser aberta por alguém que não conheciam! O adiantado da hora já não permitia a
substituição da fechadura. Este era mais um assunto com o qual teriam que
se preocupar para lá poderem pernoitar. O avô informou a avó que teria de se apressar se quisessem comprar mantimentos para confortar as barrigas que
começavam a dar sinal da falta de alimentos. Por esta altura a avó começava a
tomar as rédeas da limpeza da habitação. Desejava para si própria conseguir
levar a cabo a tarefa hercúlea de ter a casa minimamente aceitável quando o avô
e os seus filhos regressassem das compras. Muniu-se dos detergentes que a tia
Isabel deixava no armário das últimas férias e começou a limpeza das divisões.
Protegeu as mãos com luvas e dirigiu-se à cozinha e colocou num grande saco
plástico de cor preta os copos, as garrafas de vidro e plástico, todas as embalagens
vazias, todo o lixo que encontrou. Seguiram-se a sala de estar, os quartos e
por fim a casa de banho. Nesta última divisão foi aquela onde existiram as
maiores dificuldades em apagar os vestígios dos indesejáveis visitantes. A
utilização da casa de banho sem o recurso à água colocou o espaço num estado
quase indescritível. Lixívia e mais lixívia havia que se utilizar todo o poder desinfectante e terminar de vez com as bactérias que por lá habitassem. O avô
quando saiu para as compras interiormente acalentou a esperança que no regresso
pudesse testemunhar o milagre da limpeza realizado pela avó. Convínhamos que o
cenário que os avós, a mãe e o tio encontraram não é bem o cenário idílico que se deseja
para um bom início de férias. (continua)
Sem comentários:
Enviar um comentário