De regresso a casa o avô trazia na mão sacos com alguns alimentos para
confortarem as barrigas vazias. Embora a avó não tivesse realizado o milagre da limpeza tinha ficado bem perto
de o conseguir. Depois de arrumada a casa de férias começava a ter um melhor
aspecto. Embora as inquietações não tivessem ainda terminado pois havia que
minimizar o risco de intrusão. O avô conhecendo as esquisitices da avó também tinha
comprado novos pratos, copos e talheres. A refeição foi rápida e ligeira. Ficaram
gratos por terem trazido na viagem a carne que tinha sobrado da refeição do dia
anterior, naquela noite deu-lhes muito jeito. A avó tinha aproveitado a ausência
do avô e dos filhos para ligar à tia Isabel para lhe dar conhecimento do
ocorrido e, também, para combinarem entre elas o que podia ser deitado fora. A
avó e a tia Isabel sentiram que as suas privacidades tinham sido devassadas por terceiros, ambas
são muito ciosas do recheio da casa. Não lhes interessa o valor
real dos pertences, na realidade para as duas irmãs o importante é preservarem a
história, consideram-se fieis guardiãs daquele legado e de tudo fazem para manterem viva a
memória daquele que foi mais do que um padrinho de baptismo da tia Isabel. Naquela
casa centenária nasceu no início dos anos trinta do século XX o Sr. Simão e por
lá viveu antes de partir para Lisboa na procura de melhores condições de vida. Mesmo
à distância o Sr. Simão adorava a terra natal e a sua pequena casa que herdara
dos pais. Findo o jantar o avô Manel carregou na bagageira do automóvel tudo o
que foi tocado ou utilizado por terceiros sem autorização para depositar no
contentor do lixo: uma poltrona de pano, uma cadeira de cozinha cujo tampo fora
cortado com auxilio de uma faca, cobertores, lençóis, toalhas de banho,
utensílios de cozinha. De novo em casa os avós prepararam as camas para dormir e recuperarem as energias depois de um dia com muito stress.
Sabem como os avós improvisaram a protecção da casa? São exactamente nestes
momentos de recordações que me congratulo por ter nascido no seio desta família.
O avô barrou a porta das traseiras com o cabo de uma esfregona que encontrou e considerou
ser obstáculo suficiente forte para deter uma eventual entrada de intrusos. A avó parece
que não ficou muito convencida sobre a eficácia e terá tentado encostar a máquina de lavar a roupa junto à porta para servir de obstáculo pesado. Mas
o avô afiançou-lhe que não havia necessidade dizendo-lhe que por aquela porta não passaria ninguém. A avó confidenciou-me que à socapa obstruiu a dita
entrada com uma pá metálica e vários baldes, coisas que fizessem barulho. Na casa de
banho onde o vidro tinha sido quebrado a avó colocou estrategicamente junto à
janela, umas panelas de cozinha com as respectivas tampas que dariam sinal de
alarme caso alguém entrasse. Seguidamente a porta da casa de banho foi fechada à chave. Reza a história que para além
de uma noite sem dormir por parte dos avós não houve nenhum sobressalto a
registar. A minha mãe e o tio acomodados num quarto tiveram uma noite de sono bastante
tranquila sempre vigiados pela avó que de vez em quando se levantava da cama
para verificar se tudo estava bem com os seus filhotes. (continua)
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